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Traumatismo craniano em crianças



As crianças são indivíduos em desenvolvimento e apresentam fragilidades e peculiaridades que as distinguem dos adultos, como por exemplo a presença de uma estrutura óssea mais frágil na cabeça e, nas crianças mais novas, a fontanela (moleira).


As crianças são indivíduos em desenvolvimento e apresentam fragilidades e peculiaridades que as distinguem dos adultos, como por exemplo a presença de uma estrutura óssea mais frágil na cabeça e, nas crianças mais novas, a fontanela (moleira).

Essas características do esqueleto somadas ao processo natural de desenvolvimento do andar e do equilíbrio, tornam as crianças mais predispostas a traumatismos, especialmente na cabeça, levando frequentemente a procurar atendimento médico (Gráfico 1).


Gráfico 1 - Hospitalizações por acidentes na faixa etária de zero a nove anos, número absoluto e porcentagem, 2012.


Fonte: DataSUS/Ministério da Saúde





Quando essas lesões estão presentes, são chamadas de traumatismo cranioencefálico (TCE) e as estatísticas mostram que atingem mais frequentemente 3 grupos etários: dos 0 até os 4 anos, ocasionadas principalmente por quedas; dos 14 aos 24 anos, com acidentes de trânsito representando uma parcela considerável; e nos indivíduos acima de 65 anos que novamente voltam a apresentar quedas (Gráfico 2).


Gráfico 2 – Incidência de TCE por faixa etária (por 100.000 habitantes)





Fonte: Faul et al., 2010



Nem todo o trauma na cabeça é importante e para ser considerado um TCE, devemos estar atentos para alguns sinais e sintomas que realmente chamem a atenção para o traumatismo craniano, como por exemplo:

- Vômitos;

- dor de cabeça;

- sonolência;

- perda de força ou dificuldades para andar;

- alterações visuais;

- confusão;

- desmaio ou perda de consciência;

- alterações na memória ou no comportamento;

- deformidades na cabeça ou afundamentos;

- qualquer alteração neurológica nova.


Quando algumas das características acima estiverem presentes, o atendimento médico deve ser realizado com urgência para verificar se existe realmente TCE.

O TCE é uma doença complexa e existe uma classificação muito utilizada pelos profissionais de saúde que é a escala de Coma de Glasgow (ECG). Esta escala classifica os traumas de crânio em leve, moderado e grave.

O TCE grave é o que traz maior morbidade e mortalidade. A criança é admitida no hospital já em coma e algumas vezes necessita de abordagens cirúrgicas emergenciais, seja para evacuar hematomas ou descomprimir o cérebro edemaciado ou para auxiliar o tratamento do trauma com a inserção de um cateter para monitorização da pressão intracraniana (PIC).

A monitorização da PIC é importante em algumas crianças com traumatismo craniano grave. Considerando que a cabeça tem um volume fixo, se houver sangramentos ou inchaço cerebral, ocorrerá diminuição do fluxo de sangue para o cérebro, aumentando a mortalidade e as sequelas do trauma.

O traumatismo craniano moderado inspira cuidados e monitorização continua em ambiente hospitalar e, quando possível, em unidade de terapia intensiva (UTI), pois, pode evoluir com piora neurológica nos primeiros dias e necessitar de cirurgias de urgência.

O TCE leve é o mais comum e felizmente é o que guarda menor morbidade e mortalidade. No entanto, devemos estar atentos aos sintomas e sinais já descritos e procurar atendimento médico.

Uma dúvida frequente é em relação aos exames de imagem para investigar o TCE. A radiografia de crânio NÃO é indicada para diagnóstico em TCE, pois não fornece informação relevantes. A ressonância magnética é um exame demorado que muitas vezes necessita de sedação na população pediátrica e não deve ser utilizado rotineiramente. Já a tomografia computadorizada de crânio, apesar dos riscos relacionados à utilização de radiação ionizante em crianças, está indicada para os seguintes pacientes nos consensos mais atuais:

- Idade menor que 2 anos;

- vômitos;

- perda de consciência;

- mecanismo de trauma grave;

- dor de cabeça intensa ou piorando;

- amnésia pós trauma;

- hematoma subgaleal não frontal;

- ECG menor que 15;

- suspeita clínica de fratura de crânio.

O tratamento deve ser individualizado e baseado na clínica da criança, porém algumas medidas não estão indicadas para o TCE, como a utilização de corticosteroides (como dexametasona, prednisona, hidrocortisona, metilprednisolona), a utilização rotineira de manitol ou diuréticos.

Claro que o melhor tratamento sem dúvida é a prevenção. As crianças, por estarem em fase de crescimento e desenvolvimento, estão sujeitas às diferentes formas de trauma craniano, incluindo os maus tratos e negligência causados até pelos próprios familiares. Algumas estratégias de prevenção citadas por Lohr Junior (2002) são descritas a seguir:


Nos esportes e brincadeiras

- Uso de capacetes para o ciclismo, skate, patins, hipismo, patinete.

- Superfícies lisas e brinquedos com peso reduzido nos locais de recreação.

Quedas

- Colocação de redes ou barras nas janelas.

- Não utilizar andadores.

- Evitar lajes ou vãos livres altos.

- Evitar portões próximos às escadas.

Veículos automotores

- Uso de capacetes para motociclista e acompanhantes.

- Uso de cinto de segurança nos automóveis, e próprio para crianças, no banco traseiro.

- Airbags como equipamento obrigatório nos veículos.

- Prevenção e combate ao uso de drogas ilícitas na infância e na adolescência.


O TCE, portanto, é um problema potencialmente grave que atinge a população pediátrica e que necessita de um atendimento especial e individualizado, principalmente quando moderado ou grave, pois pode levar a morte ou sequelas para a vida toda da criança. Esse problema exige um envolvimento da sociedade no sentido de reforçamos todo o sistema de Saúde (especialmente o SUS) para que tenhamos uma rede de atendimento bem organizada que funcione desde o atendimento na cena do acidente, no transporte para centros de trauma capacitados e até a posterior reabilitação física e social das nossas crianças.

A SBNPed desenvolve projetos apoiando a prevenção e conscientização sobre o trauma no trânsito como o “Maio amarelo” e o “Programa de Respeito à vida” da Secretária de Governo do Estado de São Paulo.

Através do projeto “Se liga no cinto”, a SBNPed busca a participação da população em geral, na vigilância do uso de cintos de segurança e de equipamentos de contenção adaptados para crianças e animais (cadeirinhas / assentos de contenção). O foco do projeto é a sensibilização e educação de crianças e adolescentes para o uso adequado do cinto de segurança em veículos. Afinal, como disse Nelson Mandela: “A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo”.


Por: Dr. Matheus Ballestero


Referências


CDC. Centers for Disease Control. National Center for Injury Prevention and Control, Centers for Disease Control and Prevention. Traumatic brain injury in the United States; emergency department visits, hospitalizations, and deaths, 2002-2006. 2010.

LOHR JUNIOR, Alfredo. Conduta frente à criança com trauma craniano. J. Pediatr. (Rio J.), Porto Alegre , v. 78, supl. 1, p. S40-S47, Aug. 2002 .

LUMBA-BROWN, Angela, et al. Centers for Disease Control and Prevention guideline on the diagnosis and management of mild traumatic brain injury among children. JAMA pediatrics, 2018, 172.11: e182853-e182853.

KOCHANEK, Patrick M. et al. Guidelines for the management of pediatric severe traumatic brain injury: update of the brain trauma foundation guidelines, executive summary. Neurosurgery, v. 84, n. 6, p. 1169-1178, 2019.

RUTLAND-BROWN, Wesley, et al. Incidence of traumatic brain injury in the United States, 2003. The Journal of head trauma rehabilitation, 2006, 21.6: 544-548.

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